Você tem um MIP?

A primeira versão desse artigo foi publicado originalmente na Edição de dezembro da Revista Pollution Engineering Brasil, que pode ser vista aqui. O texto foi escrito motivado por essa pergunta, que sempre é feita quando alguém procura a ECD para conversar sobre Investigação Geoambiental de Alta Resolução (High Resolution Site Characterization - HRSC). Percebe-se claramente que há uma confusão na cabeça dos profissionais brasileiros que associam imediatamente HRSC com o uso do MIP, pura e simplesmente.
O Diretor Técnico da ECD, Marcos Tanaka Riyis é colunista da referida revista, e vale a pena ler os demais artigos aqui mesmo no blog.

A procura por ferramentas de investigação geoambiental de alta resolução (High Resolution Site Characterization tools – HRSC) têm crescido muito no Brasil do início de 2013 para cá. Boa parte desse aumento é decorrente da maior oferta desses serviços no nosso país, mas o fator mais importante é o maior reconhecimento da importância que a HRSC tem para os projetos de investigação e de remediação de áreas contaminadas. 
Esse reconhecimento fica patente quando se observa um importante evento do setor, o X Painel de Debates Sobre Áreas Contaminadas, promovido pelo SENAC-SP ser voltado exclusivamente para a investigação de alta resolução e quando o recém-aberto curso de Pós-Graduação em Remediação de Áreas Contaminadas, também do SENAC, tem na investigação um importante componente do curso. 
Porém, dentro da maior parte das discussões e conversas sobre o tema, é visível que existe uma confusão entre os profissionais do meio. Quase todos associam HRSC com o uso do Membrane Interface Probe (MIP). Pior ainda, muitos acham que HRSC é sinônimo de MIP. O objetivo desse artigo é tentar esclarecer as diferenças e falar um pouco mais sobre essa técnica que ganha importância a cada dia.
O MIP é uma excelente e muito útil ferramenta de HRSC, porém, é apenas uma das tecnologias existentes e disponíveis para a realização de uma boa investigação. O MIP, sozinho, não garante um melhor entendimento da área nem a elaboração de um adequado modelo conceitual, pois, como todas as ferramentas, sejam ou não de alta resolução, possui limitações.
Para entender melhor essa diferença, é preciso verificar o conceito de HRSC, de acordo com a USEPA: HRSC são tecnologias e estratégias que coletam dados em escala apropriada e em grande densidade para definir a distribuição da contaminação e o contexto do meio físico em que ela está inserida com nível reduzido de incertezas, subsidiando remediações mais rápidas e eficazes. 
Dentro desse conceito, as ferramentas de HRSC podem ser divididas em dois grandes grupos: 

1) as de screening de concentrações de compostos químicos de interesse e 
2) as de avaliação do meio físico. Como avaliação do meio físico, entende-se as heterogeneidades hidrogeológicas, as zonas preferenciais de fluxo e armazenamento e a condutividade hidráulica (K) relativa em escala de detalhe.

Dentre as principais ferramentas de screening de concentrações, podem ser citados: os métodos LIF (Laser-Induced Fluorescence) como o UVOST, que tem excelente capacidade de detectar fase livre de hidrocarbonetos; os laboratórios móveis (também chamados de “laboratórios de campo”) e o MIP, que tem a vantagem sobre o UVOST de conseguir detectar concentrações de solventes clorados. Tanto o MIP quanto o UVOST funcionam como um ensaio in situ, por meio da cravação do sensor no solo e obtenção dos dados em tempo real a cada 2-20 cm, dependendo do equipamento. O laboratório móvel é uma estrutura física que vai ao campo e faz análises rápidas (e muito precisas) de amostras pontuais de solo, água ou vapor coletadas na área, permitindo uma tomada de decisão na hora, ao invés de ter que aguardar o retorno dos resultados das análises químicas em um laboratório tradicional. Percebe-se, portanto, que o MIP é uma dentre as 3 principais ferramentas do grupo de screening de concentrações das ferramentas de alta resolução. Embora importante, não é a principal, tampouco a única.
Dentre as principais ferramentas de avaliação do meio físico, destacam-se:
- o Hydraulic Profiling Tool (HPT), que funciona injetando um fluido e medindo a vazão/pressão de injeção para relacionar esse valor com K;
- o sensor de condutividade elétrica (EC), que pode identificar camadas saturadas, argilosas, com intrusão salina, com metais dissolvidos, e outros;
- o Cone Penetration Test (CPT), ferramenta originária da geotecnia que determina com excelente precisão a estratigrafia e as diferenças entre argila e areia;
- o piezocone (CPTu), ferramenta que alia o CPT à determinação da poro pressão a cada 2 cm. Essa medida de poro pressão pode ser relacionada com K (é inversamente proporcional ao log (K));
- o Pore Pressure Dissipation Test (PPDT), ensaio que fornece, pontualmente, valor de K em uma região de baixa permeabilidade;
- o Direct Push Slug Test (DPST), ferramenta que crava no solo uma ponteira retrátil, que permite a entrada de água subterrânea em uma seção filtrante de 30 cm para se realizar um Slug Test (e obter o valor de K nessa camada de interesse) e pode ser usada para coletar amostras de água para análise no laboratório móvel;
- e o piezocone de resistividade (RCPTu), ferramenta que une, no mesmo sensor, o CPTu e o EC, e ainda permite a realização de PPDT, fornecendo informações diversas a cada 2 cm que possibilitam um entendimento muito bom do meio físico, com uma grande variedade de dados.

Embora as conversas atuais no Brasil sobre esse tema girem em torno da necessidade de se obter dados do perfil de concentração de compostos químicos, sem que o Consultor saiba se aquela concentração é retida, dissolvida ou em outra forma e sem que esse Consultor associe essa concentração às características do meio físico e elabore um adequado modelo conceitual, muitos autores e pesquisas apontam para outra direção.
Para esse grupo de pesquisadores, cujo maior expoente é Joe Quinnan, da Arcadis/USA, a elaboração do “perfil hidroestratigráfico” (perfil estratigráfico com K em alta resolução) é o componente mais sensível e importante da investigação, pois é o que apresenta maior variação. Kober et al (2009) afirma que a qualidade do modelo de previsão do transporte de contaminantes é fortemente dependente da caracterização tridimensional de K, e Einarson et al (1999) mostrou que as variações da geologia são mais importantes para o transporte que as características e concentrações do contaminante. Portanto, pode-se dizer que as ferramentas de screening de concentrações, embora muito úteis, não são as mais importantes para um adequando diagnóstico geoambiental do site. O principal fator limitante para um projeto de remediação é a heterogeneidade hidrogeológica, e sem conhecê-la, a informação em alta resolução de screening de concentrações não será suficiente para elaborar um adequado Modelo Conceitual. Ou seja, o MIP, sozinho, vai fornecer dados muito bons sobre a distribuição vertical do contaminante, porém, sem nenhuma informação acerca das características do meio que governam o transporte desses contaminantes. Nós já falamos sobre isso nessa postagem.

Portanto, a melhor abordagem para uma HRSC é utilizar uma ou uma combinação de ferramentas de caracterização do meio físico em alta resolução, e através dela, selecionar zonas-alvo para coleta pontual de amostras e análise em laboratório de campo. Com esse “kit”, é possível elaborar um Modelo Conceitual tridimensional adequado de fluxo, transporte e armazenamento de contaminantes. Nota-se que essa abordagem não utiliza o MIP, mas ainda assim é uma excelente investigação geoambiental de alta resolução e vai embasar um projeto de remediação mais rápido, barato e eficiente.

Como resposta à pergunta que dá título a esse artigo, podemos dizer que não temos o MIP, mas oferecemos às consultorias ferramentas adequadas para a melhor investigação geoambiental de alta resolução, com ênfase no meio físico, e com ferramentas adequadas para também obter informações relevantes sobre as concentrações, tanto no solo, quanto na água subterrânea.

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